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sexta-feira, 31 de janeiro de 2014

Loucura passageira (1 Ato)




o       Bom dia.
o   Bom...
o   Desculpa, é você...?
o   Como?
o   É você?
o   Como assim? Eu não te conheço!
o   Perdão, eu pensei que era você... ou, alguém que conheço...
o   Beleza! Eu não sou...
o   Mas parece hein...
o   É mesmo... tenha um bom dia
o   É a cara de alguém que conheço...tem certeza que você não é...
o   Não, eu não sou alguém que você conhece.
o   Mas como você sabe... você mesmo disse que não conhece o alguém que eu conheço.
o   Justamente eu não conheço nem sou este alguém.
o   Perdão... parece que esse alguém é outro...
o   Sim, é.
o   O senhor me perdoa...
o   Beleza.
o   Que horas são?
o   São três.
o   Ih! acho que vai chover...
o   Está com cara.
o   Perdão, viu moço... mas que parece..parece hein...
o   Acontece que todo mundo parece com alguém.
o   É...todo mundo parece com todo mundo.
o   É...
o   Mundo pequeno né...
o   É...
o   Sabe este alguém que conheci...
o   Perdão, mas eu não te conheço e não quero ouvir sua estória.
o   Oh dó! Desculpe você deve estar ai com seus pensamentos.
o   É...
o   Pensando em alguém?
o   É...
o   Viu todo mundo tem um alguém.
o   Mas...este alguém eu conheço.
o   Tem certeza?
o   Como assim?
o   Veja eu...pensei que eu conhecia alguém... e vim conversar com você...pensando que este alguém fosse você
o   Acontece...desejo que você encontre o alguém que tanto busca (toca o celular) "Alô...ah não... acredita que estava pensando em alguém...e esse alguém me liga...e ai, vai rolar hoje..."
o   Uns tem sorte... outros não...uns encontram alguém...outros...só desengano e solidão...(o outro continua ao telefone...rindo..e falando cada vez mais alto)
o   (Desliga o celular, ri para o céu... e volta a esperar o ônibus... solta o ar) 
o   Era ela?
o   Ela? Quem? Você não acha que está abusando não?! (perdendo a paciência)
o   Perdão, curiosidade... é que eu...
o   Amigo... já deu! você acha que  encontrou alguém....esse alguém não sou eu... agora por favor...eu não quero conversar...quero esperar o ônibus!
o   Perdão.... mas sabe, dá uma inveja boa lá no fundo...
o   Do que?
o   De alguém que tem um alguém para sair na sexta-feira.
o Você estava ouvindo a minha conversa... você é louco? isso é uma pegadinha? ou,  está me pegando para Cristo...
o   Sexta-feira 13... que azar...fui encontrar o meu alguém errado...
o   Você fica abordando as pessoas assim nas paradas de ônibus?
o   Claro que não, só as que eu conheço...
o   Hum... ou, as você pensa que conhece, ou que conhecem alguém que com certeza você não conhece.
o   Isso mesmo... é sempre mais fácil fazer uma amizade com um detalhe em comum.
o   Detalhe? (com cara de espantado)
o   Isso! de ter alguém... de ao menos conhecer alguém que conhece alguém...pode ser o inicio de tudo.
o   De tudo o que? (faz cara de descrente) 
o   De tudo...de uma amizade... um encontro que pode gerar um negócio...um pedido de casamento...
o   Beleza, você é evangélico....deve estar procurando alguém para pregar a palavra....e isso é uma forma de abordagem... ótimo...mas eu não estou interessado...eu não sou aquele alguém que quer ouvir a palavra
o   Eu não sou evangélico... eu sou ateu.
o   Ateu? não parece...
o   Pois é... uma longa estória...estória boa de contar...eu era motorista de um senhor... chegou a ser secretario ou ministro de alguma coisa na antiga capital, o Rio...era comunista.
o   E ele te ensinou a ser ateu?
o   Era um alguém de ótima conversa.... dizia que não acreditava em deus...aprendi muito com ele sobre o mundo...dele falando comigo...dele com outros...tinha outros comunistas que não eram ateus...tinha também comunista ateu...e tinha só ateu.
o   E esse ônibus que não chega (impaciente)
o   Ai ele morreu... mas antes nem precisou me convencer..eu fiquei convencido...existe deus não viu  (com ar solene)
o   Não.
o   É o sistema... só existe o sistema...o sistema...(dedo em riste, com a voz empostada)
o   Amigo, o muro caiu, é sexta feira 13... estamos em 2014
o   O sistema...ele dizia...e as macroestruturas...determinam tudo as estruturas...
o   (silêncio)
o   Sabe o que ele sempre dizia para mim...
o   Não.
o   “Já que não existe ninguém superior nem inferior a nós, temos que nos respeitar e ajudar”
o   Opa! Essa é boa...como era o nome desse alguém mesmo...era importante?
o   Oh! se era!
o   Diz ai quem era...
o   Você não vai acreditar mesmo ...tem cara de alguém que não acredita muito nos outros...
o   Eu não tenho essa cara...estou aqui conversando com você....e nem te conheço.
o   Ah! isso é...eu posso estar enganado.
o   Diz ai.
o   Diz o que?
o   Qual era o nome do comuna?
o   Era famoso...dizem que fez uma caminhada de tal ponto distante ao outro lado mais distante ainda.
o   Que...
o   É que eu não entendo muito bem essa história...mas vinha todo tipo de pessoa conversar com ele...ih! parecia uma procissão...de toda idade...menina novinha...homem mais velho que ele...e todos perguntavam da tal caminhada...ou, era marcha?...eu ficava às vezes ouvindo...não é certo...mas eu ficava...na intenção de aprender alguma coisa.
o   Que caminhada? Fala logo.
o   Mas quando eu o conheci aqui em Brasília já era bem velho ...mas velho do que eu hoje...
o   Vai dizer ou não...
o   Seu Luiz era alguém que respeitava os outros...com os mais humildes ai que ele tratava bem...coisa diferente de ver alguém fazer do jeito dele
o  Ah!  Calma lá. È...é o Luiz Carlos Prestes...o Cavalheiro da Esperança? (espantado)
o   Isso mesmo...era assim que disseram dele na TV
o   Caramba você era motorista do cara?
o   Pois é...viu...
o   Viu o que?
o   Que eu não sou qualquer alguém
o   Eu não disse isso...
o   Mas chegou a pensar que eu era louco
o   Eu não disse isso! (junta as mãos como quem pede perdão)
o   Disse...só porque confundi você com alguém que eu conheci a um longo tempo atrás
o   Quem...numa parada de ônibus também...
o   Deixa para lá...devo estar atrapalhando o seu dia....o senhor é um homem ocupado..e eu aposentado...vim aqui na agencia central do Banco do Brasil...(suspira, conformado)
o   Eu não quis ofender é que...
o   Eu sei...é muito difícil alguém aceitar conversar com alguém que pensa que conhece alguém
o   É...é estranho...
o   Pois é...o seu Luiz dizia que no tal comunismo todos são donos de tudo
o   É... mais isso já era...descambou...caiu...finito mano!
o   É...eu sei...mas no enterro dele...foi muita gente que acredita no que ele acreditava
o   Você foi...
o   Eu lembro...vi pela TV
o   O senhor acredita em que?
o   Sou eclético...vou de Buda à Jesus
o   Buda?
o   É aquele mestre dos indianos..
o   Ah sim..o gordinho sentado... a  vizinha tem um em cima da geladeira... a filha faz uma coisa da India...dizem que é Yoga...fica se contorcendo e depois canta esquisito...eu fico só ouvindo...língua diferente viu.
o   Mas você é bom de papo...parece alguém  que conheci
o   Quem?
o   Deixa para lá...esse ônibus não passa né...
o   Viu...
o   Viu o que?
o   Todo mundo conhece alguém...o mundo é feito de muitos alguens que precisam se conhecer para que a vida tenha sentido...a vida é arte dos encontros embora haja tantos desencontros...
o   Oh, o senhor está bem filosófico hein.
o   É do cavalheiro...não com essa palavras...é mais ou menos...as vezes dava vontade de parar e escrever...sujeito das ideias...
o   Era o cara.
o   Oh, se era!
o   Há muito tempo atrás eu li "Olga".
o   Quem...
o   Não conhece o livro "Olga"...fala da mulher dele...a que era alemã...Getúlio entregou-a a Hitler, que a mandou para um campo de concentração...
o   Olga..sei não...não lembro do seu Luiz comentar isso não
o   Pois é, era uma grande mulher!
o   É mesmo? Ele foi casado com essa Olga...
o   Sim, foi...
o   E como foi isso...
o   Ih! amigo é uma longa história...mas o livro é muito bom e está em todas as livrarias...vale a pena ler.
o   Vou ver isso...viu, que coisa boa...
o   Boa? Como?
o   Eu achava que conhecia alguém..não era o senhor...e agora que o senhor já me conhece melhor, até me indicou um livro.
o   Pois é...eu não esperava por essa...motorista do Luiz Carlos Prestes...o pessoal do trabalho não vai acreditar...
o   Perdão, é mentira...
o   Como assim...
o   Eu ouvi essa estória de alguém que conheceu alguém que conhecia o motorista dele...
o   Então, você não era motorista dele? (zangado)
o   Não era não...mas conheci alguém que conheceu alguém que era sim
o   Ah faça-me o favor...e você sai por aqui contando uma história que não é sua.
o   É a tal coisa de quem conta um conto aumenta um ponto...mas a estória é bonita...eu acredito...
o   Olha aqui! Eu estava na minha, e você veio com o papo de alguém...ah vai se tratar!
o   Mas você estava gostando da estória...
o   Estava...
o   Só porque era alguém famoso...acabei de confirmar minha teoria
o   Não...não era só porque era uma estória de alguém famoso é que...olha aqui...eu não gosto de mentiroso
o   Não é mentira...é verdade...
o   Que teoria?...do que...é mentindo que se aborda alguém na parada de ônibus...ou, que a loucura é passageira, o resto é tudo motorista em Brasília (rindo)
o   Se você diz que conhece alguém famoso...as pessoas acham que você é alguém
o   Mama mia...você não bate bem!
o   Moço, perdão....eu estou precisando inteirar a passagem...
o   É isso
o   É...
o   Quanto?
o   Vou para Santa Maria...
o   Tá bom..pega aqui
o   Oh, cinco reais...está se vendo logo...
o   Beleza, vai lá e tenha um bom dia!
o   Obrigado, foi bom conversar com o senhor...de longe a gente sabe que é alguém bacana...de bom coração
o   Obrigado...valeu...
o   Posso dizer mais uma coisa?
o   Diz! (enfático)
o   Eu achei mesmo que conhecia alguém que era assim como o senhor
o   Beleza,  já conversamos isso.
o   Oh! moço? ...O senhor acredita em Deus?
o   Eu disse que era eclético...
o   Eclético..como é isso?
o   Ah! deixa para outro dia
o   Isso faz parte da estória de alguém?
o   Sim, um tal alguém...dizem por ai, sacou?...valeu cara!
o   Então você também gosta de contar estórias de outras pessoas....
o   Como assim...
o   De contar estórias que não são suas
o   Como não são minhas?
o   Você mesmo que disse...que é eclético..que é de Buda...de Jesus...mas as estórias não são suas
o   São estórias universais da humanidade...que todo mundo tem de saber um dia
o   Você parece que gostou bastante da coisa do Cavalheiro da Esperança...
o   Claro, ele foi um grande homem
o   Tão importante quanto o Buda?
o   Não tanto...mas foi importante para uma época.
o   E o Buda?
o   Caramba, meu ônibus chegou! Bom dia!
o   Bom dia! Vai com Deus!
          
    



sábado, 11 de janeiro de 2014

Altura é para borboletas

me perdoem 
as mulheres de estatura baixa
mas altura é fundamental
contudo difícil de medir

se um brilho de cume nos olhos residir 
seja do Aconcágua
ou dos picos do Himalaia
pode-se ao lado dela ver 
mais longe apesar do medo

se as pernas não são longas nem torneadas
pode haver um tal movimento coordenado
entre os ossos da bacia e da coluna
que a bailarina ali presente
tece ilusões de uma centopeia
ou no mínimo de uma lagarta
a espera por estes versos para se metamorfosear

ao poeta cabe com charme e graça
adornar a beleza de tais mulheres
com altura de borboletas


Gastronomia e Poesia

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